Tratado Vícios e Virtudes – Vícios Opostos às Virtudes de Caridade – Calúnia

VÍCIOS OPOSTOS ÀS VIRTUDES DE CARIDADE

Calúnia

A calúnia nasce da murmuração e da soberba. O orgulho ou o amor-próprio ferido também produzem a calúnia. A murmuração, sua mãe, alimenta tão terrível monstro. A calúnia não apenas atenta contra a caridade, manchando, mas dá-lhe também a morte. É a calúnia um lodo que macula tudo o que toca. É semelhante ao azeite, cuja mancha não sai apesar da limpeza.

Consiste a calúnia em qualquer falso aviltamento do próximo, em matéria mais ou menos grave, sobre honra e fama, pública ou privada. Pode permanecer apenas dentro do coração do homem. Pode ser considerado calúnia tudo o que denigre falsamente o próximo.

Da murmuração para a calúnia somente há um passo. A murmuração consiste propriamente em criticar fatos e palavras alheias. Mas é tão fácil exagerar tais fatos ou palavras, que, para passar à mentira e, portanto, à calúnia, de fato já não basta um passo, mas uma tênue linha.

A murmuração não só faz com que o murmurador se exceda, mas, ferindo os ouvidos alheios, provoca neles também horríveis tempestades, e ainda acende o fogo da cólera e da ira, muitas vezes resultando dessa desordem o transbordamento das paixões e as calúnias contra o próximo.

Jamais se deve revelar ao infamado a pessoa que o caluniou, a não ser em casos especiais de dano maior, em que a prudência e a caridade aconselhem o contrário.

Essa questão do amor ao próximo é muito delicada: a calúnia é um terrível falso testemunho que rompe Minhas leis, atraindo grandes castigos. Ai de quem calunia! Ai de quem espalha, mundo afora, a fama do irmão, denegrindo-a! Ai do miserável que, ferido por alguma paixão, ciúme, inveja, ódio ou ira, realiza sua maldosa vingança por meio de uma temerosa calúnia.

A calúnia é um pecado tão grande que, para ser apagado ou perdoado, precisa da restituição da honra manchada junto às pessoas diante das quais foi pronunciada ou espalhada. Será possível juntar de volta o pó que foi espalhado ao vento? No entanto é necessário e indispensável, para obter o perdão, restituir a fama e a honra, que são mais preciosas e valiosas do que todo o ouro do mundo. E, se Eu sou tão exigente para a restituição dos bens materiais a ponto de não perdoar o furto sem a devolução do que foi furtado, tanto mais severo serei a respeito da honra e da fama denegridas, cujo valor não se compara ao que é vil e material, sendo infinitamente maior! Ai! Embora sendo um dos graves pecados que mais me ofende, pratica-se copiosamente no mundo, por vezes também – fato espantoso! – entre os que se dizem Meus!

Esse ponto é delicadíssimo: se as almas entendessem a gravidade desse crime, deter-se-iam em suas apreciações rancorosas e odiosas vinganças. A corrente de vícios que hoje transborda e inunda o mundo, contaminando também o campo espiritual, com suas paixões desenfreadas, é a fonte de tão grandes crimes. Digo crimes, porque é um crime tirar a fama do próximo. Ainda mais: em muitos casos, esse homicídio moral, infame e espantoso, é mais grave que tirar a vida do corpo.

Quantas calúnias ocorrem diariamente no mundo!

A difamação, horrível vício, irmã da calúnia, reina hoje em todas as classes sociais. Essa maldita paixão, que abriga muitas outras tão graves e abomináveis quanto ela, age desenfreadamente. Calúnia e difamação encontram-se em palavras, escritos, lares, praças e até na boca de crianças. Um estrago terrível causam no mundo espiritual assim como no mundo dos teatros e dos bailes. Existem em todas as classes sociais, e seu veneno chega a invadir até o recinto sagrado do matrimônio, sacramento santo instituído por Deus e protegido pela Igreja. Pouco importa à calúnia e à difamação penetrar no matrimônio e semear discórdias, dúvidas, lá onde deveriam sempre reinar a paz e a santa harmonia. Desgraçado é aquele que, por vingança, perversidade ou malícia, mancha a honra do lar com a vil calúnia e a cruel difamação. Eu o prometo: seu castigo será muito grande, e Minha justiça será terrível sobre quem desonrar um inocente.

A calúnia e a difamação são mais que vícios; são a explosão estridente de vícios e paixões sufocadas.

Seu remédio é tão árduo! Seu perdão é tão difícil! Porém a alma que, arrependida e dolorosamente contrita, se humilhe, chore sua culpa e use de todos seus meios para repará-la, alcançará o perdão, ainda que tenha de expiar, depois da morte e ainda durante sua vida, pecado tão grave!

Esse pecado é daqueles que geralmente castigo também em vida. Já neste mundo Eu faço sentir o peso da Minha justiça ofendida sobre o coração que se mancha com um crime tão nefando e terrível.

A murmuração é o caminho que leva à difamação e à calúnia. Que as almas se detenham se não quiserem precipitar-se no abismo aterrador. Que fujam da murmuração como do mal mais contagioso, e se abriguem dentro dos sólidos muros de uma inquebrantável caridade.

Oh,se almas agissem assim! Quantos pecados evitar-se-iam, e quantas almas perderia o demônio! Calúnia e difamação, armas preferidas por Satanás, perderiam seu vigor ao esbarrar na pacífica e calma caridade cristã. A base ou fundamento da religião católica firma-se na caridade, ou seja, no amor a Deus e ao próximo. Onde não há essa caridade, não há cristianismo.

O homem não é digno do título de cristão, se não pratica a caridade.

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