Tratado Vícios e Virtudes – Vícios opostos às Virtudes de Humildade – Soberba Espiritual

Vícios opostos às Virtudes de Humildade

2.Soberba espiritual

Existe uma soberba clara, se é que à soberba pode aplicar-se essa palavra.

É a menos nociva e a mais fácil de extirpar. Há também outra soberba, espiritual, veneno e destruição de toda comunidade religiosa. Quantos estragos! Quantas almas enganadas, precipitadas na ruína sem ao menos saberem por quê!

Contudo a soberba mais prejudicial, que corrói os corações no oculto, mata e ainda passa desapercebida, é a soberba espiritual perfeita.

Chamá-la-emos assim porque é tão refinada e delicada, quão venenosa e prejudicial. Esse tipo de soberba é a que reina nas almas que se dizem Minhas. Nelas se esconde entre mais secretas dobras da inteligência, da memória e da vontade. É tão disfarçada, que só pode ser vista graças à luz divina! Geralmente as almas que a abrigam, passam por Santas aos olhos do mundo.

As próprias almas não se dão conta de que têm em si esse tipo de soberba.

Mesmo quando, por uma graça muito especial, se descobrem soberbas, duvidam, turbam-se, rejeitam semelhante calúnia (em sua opinião, mesmo que não o expressem dessa maneira). Exatamente o ressentimento dessas almas representa o sintoma de que há nelas uma chaga que sangra. Há de passar muito tempo para que essas almas se convençam de seu erro, e não terão outro remédio a não ser uma firme e profunda vida de humilhação, até tomarem de volta o caminho legítimo que as reconduzirá àquelas moradas autênticas a que se chega unicamente pelo estável caminho da humildade.

Terríveis são os perigos da soberba sem a graça e o dom especial do Espírito Santo, que envolve e defende as almas.

Numa falsa vida extraordinária, a soberba reina constantemente como senhora. Pode, por vezes, chegar a entrar até numa vida extraordinária verdadeira, mas sai derrotada. Pode disfarçar-se e enganar por um tempo. Ao fim e ao cabo, será sempre descoberta e banida.

Na vida extraordinária interna e perfeita, o Espírito Santo mantém sua morada, a alma é fiel e tem em si o dom da humildade, inimiga mortal da soberba, que, assim, não tem brecha e é sempre barrada e rechaçada. Essa, porém, é graça especialíssima outorgada pelo Espírito Santo a mui poucas almas. Por isso, não se deve confiar nem descansar na luta contra esse inimigo capital que infecciona com seu hálito impuro todos os atos da alma e da vida da criatura.

Eis um alerta para a vida interior: a maioria das almas jaz adormecida nas finas redes da soberba espiritual e da soberba espiritual perfeita. Essas almas passam sua vida tranquilas em meio a elogios, sem divisar a serpente infernal que há dentro delas e que as adormece. Ao seu redor, há um ar de fina autocomplacência, e nenhum vento é capaz de tirá-las daquele suave ar perfumado que respiram.

Acostumam-se com práticas exteriores de humildade com que acreditam estar a salvo da soberba, quando nisso mesmo manifesta-se a cauda serpentina desse vício maldito.

Criam hábitos de penitências e mortificações, comuns e privadas, com as quais entendem estar a serviço de Deus, o que lhes proporciona a paz do dever cumprido e até a ilusão de ser generosas, em razão do que se gloriam e
envaidecem por suas obras. Em seu íntimo, nutrem sentimentos de grandeza, acreditam valer mais que as outras e ser as prediletas de Deus.

Mesmo quando, à primeira vista, rechaçam tais pensamentos como tentações, nelas permanece o gozo especial de uma dúvida prazerosa que as entretém e as faz felizes. Mas isso, lá, bem no fundo, sem que sequer desconfiem de sua soberba. Pobres almas enganadas! O que elas creem serem tentações, são aromas que brotam do próprio incenso que está dentro delas.

Essas almas, ao examinar-se a si mesmas, encontram-se Santas mesmo quando se dizem pecadoras. Com sua vista ofuscada, não acham nada que possa tirá-las do trono em que se encontram. Faltas e pecados estão longe delas.

Não sabem que estão à beira de um precipício. Não sabem que o demônio em pessoa realiza, nelas, sua colheita de forma diferente, pondo-as num pedestal e fazendo com que mui secretamente se adorem.

Quantos casos desses há na Igreja!
A dor destrói a soberba. Somente a Cruz, com sua ação divina, é capaz de expulsar Satanás e destruir suas maquinações. A almas incautas e superficiais, Satanás sabe dar consolo e agrados ilusórios, que no meio do mel escondem veneno. A firmeza está numa vida de intenso sacrifício, na destruição do homem velho, na prática firme das virtudes morais. A Cruz desmascara a soberba e todos seus disfarces. A dor impulsiona fortemente a vida espiritual: aclara falsos caminhos extraordinários, tão cheios de mel e perigos satânicos.

Nas comunidades religiosas, há muita mundanidade e sensualidade: a Cruz é postergada, e dificilmente alguém dispõe-se a ser cravado nela. As comunidades religiosas afundam, porque lhes falta a Cruz. Permitiram que reinasse a comodidade.Pelo contrário, faz-se necessário que a dor ocupe seu assento. Já é tempo que as almas despertem, vivam da Cruz e para a glória de Deus. A Cruz e a dor vêm destruir a soberba: são as armas que a vencem e destroem nas almas.

São essas as armas que o demônio mais teme, porque são letais para os vícios.

Bem-aventurada a alma que se agarra à Cruz e se prende nela! A Cruz lhe servirá de escudo e defesa contra a soberba e seus sequazes. Será repleta da abundância dos dons e das graças do Espírito Santo.

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