Tratado Vícios e Virtudes – Introdução ao estudo dos vícios – Pobreza

2.Pobreza

A pobreza é muito semelhante à santa obediência e à bela humildade. O desprendimento total da pobreza consiste em nada possuir, o que tem tudo a ver com o não pertencer-se a si mesmo.

Digam os religiosos: Dou-me, entrego-me, esvazio-me, nulifico-me,
devolvo tudo, despojo-me de tudo, entrego todas as pessoas, todos os afetos; devolvo ao Senhor tudo o que d’Ele tenho recebido, com todos os seus dons e gracas; dou o meu corpo, a minha alma, a minha vida, os meus sentidos e forças, os meus sentimentos e palpitações, e até a minha eternidade. Isso é o desprendimento da pobreza, que, ao despojar-se, sente mais fome de mais pobreza. Porque as virtudes participam daquela fome e sede insaciável de Deus, que nunca se satisfaz, deixando a alma a anelar constantemente o imenso e eterno Bem. As virtudes são emanações do mesmo Deus e participam da sua
infinitude.

A pobreza, não só a exterior, mas também a interior e espiritual, há de ser a veste do religioso. Meu Coração ama muito essa virtude: Eu a pratiquei por toda a Minha vida, até o último instante da Minha passagem sobre a terra.

Muito pobre, aos Meus olhos, é um religioso vaidoso, mas o religioso pobre, material e espiritualmente, é rico no céu. Quero-vos muito pobres: desprezai todo adorno e comodidade até desdenhar a vós mesmos.

Desnudai-vos de todo odor mundano e revesti-vos só de Jesus. A cada dia, encontrareis mais riquezas e encantos na pobreza.

Vesti-vos com muita modéstia.Sejam as vossas jóias as mesmas que Me adornaram. Em Minha morte, para o Meu corpo, sobraram apenas o lenho da Cruz, o ferro dos cravos e pontudos espinhos. Estudai-Me, e sede Meu retrato fiel no desprendimento perfeito de tudo o que existe, na terra e no céu, em Deus e por Deus.

Pobreza e obediência têm cor e aroma bem parecidos. Esse aroma perfuma tudo quanto toca e dá valor aos atos da criatura até onde só eu sei. Essas virtudes exalam bálsamos divinos, brotam do Meu Coração e são Minhas amadas. A pobreza é uma rainha coberta de farrapos, tem aspecto desagradável, mas, ao ser abraçada, seu aroma torna-se delicioso. Com ela desfruta-se de uma paz e felicidade desconhecidas ao mundo.

O Senhor enche as mãos que estão vazias. Agrada-Lhe dar àquele que nada tem e reconhece que tudo o que tem é d’Ele, e a Ele o devolve. Esse receber e devolver faz crescer o tesouro que o Senhor derrama na alma do pobre. E o Senhor regozija-se nesse comércio santo, em que, ao receber mais, mais devolve. Porém ai da alma que se agarra a essas graças como sendo próprias!

Eu levo comigo Meus tesouros. E quem Me tem, tem-Me a Mim todo.
Porém não em si, mas em Mim mesmo.

A alma unida a Deus é rica das riquezas de Deus. Porém totalmente vazia ou pobre em si mesma. Isso quer dizer que tudo tem sem tê-lo, permanecendo em sua pobreza ainda que esteja adornada de pérolas. Por aqui se vê a necessidade de um radical despojamento de si mesmo para quem queira empreender com fruto uma vida espiritual perfeita.

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